Crimes de Colarinho Branco
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- Não percebo! … Fala-se tanto nos crimes de colarinho branco … e ao que parece até causa danos gravíssimos … ainda agora no caso do BPN, veio à baila os índícios de gestão danosa … mas nunca se ouve dizer que alguém foi condenado por perpetrar esse tipo de crime …
- Não se ouve … porque, provavelmente, esses criminosos não são efectivamente condenados!
- Então … Mas porquê?
- Porque esses criminosos até podem usar “colarinho branco” … mas a camisa tem cor … e essa cor, por norma, coincide com as cores dos principais partidos representados na Assembleia da República …
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... As explicações que faltavam dar
Num passeio domingueiro, João Trovão e Maria Relâmpago, passam em frente a um Palácio da Justiça.
Inspirada pelo momento, Maria questiona João:
- Tens estado a par das polémicas causadas pela entrada em vigor do Novo Código do Processo Penal?
- ... Só de alguns pormenores ...
A resposta vazia de João, leva a que Maria insista:
- E acerca do teor dessa Lei ... que permitiu a libertação de tanta gente, tens alguma opinião?
Da insistência, resultou que João começasse a “desbobinar”:
- Querida, o Código que agora entrou em vigor foi elaborado no auge de processos mediáticos ,como seja o da Casa Pia e outros que envolviam gente famosa, considerada acima de todas as suspeitas ... e a não entrada em vigor durante esse período foi o resultado de haver vozes moderadoras que se levantaram e que exigiram que a sua redacção fosse o resultado de reflexão ponderada e não a apresentação de medidas avulsas apresentadas à pressa, feitas de encomenda para libertar esta ou aquela personalidade do Jetset Nacional.
- Se houve uma reflexão, não parece! Agora toda a gente censura o seu texto!
O reparo de Maria é corroborado pelo marido, que explica:
- Na realidade, tempo para reflexão houve ... mas ninguém reflectiu coisa nenhuma e o que estava pensado nessa altura, foi o que acabou por ser aprovado.
Maria sente enormes dificuldades em entender quais foram as reais intenções do legislador e vota à carga: - Então porque é que aqueles que poderiam ter ajudado à elaboração da Lei, agora estão incomodados com aos efeitos da aplicação da nova legislação?
- Isto foi assim, de início todos concordavam com a nova redacção; os políticos porque viram reduzida a possibilidade de eles, bem como dos seus “amigos” e conhecidos, serem presos e pensaram também que aquilo que se pretendia era simplesmente aplicação do Simplex à justiça criando mecanismos por forma a libertar hoje quem só poderia ser libertado amanhã; os advogados existentes, os estudantes de Direito e os demais agentes da justiça porque pensavam que o que o governo queria colocar os prevaricadores na rua afim de que viessem a causar distúrbios de modo darem trabalho a todos esses profissionais da justiça, sim porque se os criminosos estiverem todos nas cadeias, eles ficam sem trabalho; o “lobby” das Seguradoras porque viram na alteração à Lei, a possibilidade de aumento do seu volume de negócios; os membros do clero porque viram na alteração da lei uma forma de reforçar a ideia cristã do perdão, adicionando uma simples adenda ao espirito cristão da Lei .... dessa foram ao conceito de que «devemos perdoar a quem nos tem ofendido», imaginaram que agora só tinham que acrescentar simplesmente: «(...) roubado, violado, assassinado... » ... enfim todos os agentes económicos viram nessa medida a possibilidade do volume de negócios vir a aumentar fomentando dessa forma o crescimento da economia nacional ...
- E o que é que mudou entretanto?
- O problema de Código Penal se ter transformado numa caixinha de Surpresas, está mo facto do governo ter feito um género de jogada de xadrez, fez uma jogada com uns objectivos quando toda a gente pensava que os objectivos eram outros.
- Então quais são os objectivos do Governo ... ou do Estado? Não foi só uma formula habilidosa de esvaziar as prisões?
- Não! ... Ao reduzir o tempo de prisão preventiva o objectivo é tomar medidas no sentido de que os lesados não façam queixa por receio de represálias, as próprias polícias fugirão de prender quem quer que seja, pelos mesmos motivos ... desta forma estão criadas as condições para que sejam despedidos agentes policiais ... entretanto, havendo uma redução no número de queixas , haverá uma redução do número de processos nos tribunais, dessa forma o governo resolve o problema da existência de muitos processos pendentes e da celeridade da justiça e ainda conseguirá uma redução do número de horas extraordinárias, bem assim como na quantidade de juizes e funcionários judiciais e com um pouco de sorte ainda consegue encerrar um ou outro tribunal... e logicamente que havendo menos processos, e menos presos, fica resolvida a situação de superlotação das prisões portuguesas, assunto que tem merecido repetidos reparos da Amnistia Internacional ... e ainda podem garantir a pés juntos que o índice estatístico de criminalidade vai baixar ... só vantagens! ... económicas para a contenção de despesas e não só por parte do governo ... só que logicamente todas estes metas esbarram nos interesses de muito boa gente, que de um momento para o outro vêem o seu emprego colocado em risco e para além dos já citados policias, guardas, guardas prisionais, funcionários dos tribunais e das cadeias ... ainda há o grupo dos intocáveis - os advogados, pois sem queixas, não há processos a decorrer e sem processos, e nessas circunstâncias os advogados não são precisos para coisa nenhuma ... não admira portanto que estes estejam a reagir corporativa à introdução da nova legislação ... ou seja a media só salvaguarda os interesses dos bandidos, das seguradoras que terão mais pessoas a fazer seguros de vida e contra roubo e todos os demais agentes económicos que verão os lesados a adquirir novos bens afim de substituir os roubados ou danificados por quem o Estado quer ver longe das grades ...
de dia ou ao serão ... salutares?
No Telejornal passa mais uma reportagem em que é vincada a ideia de que as caminhadas são óptimas para a saúde e Maria Relâmpago observa: - João! Não achas que também nós deveríamos fazer umas caminhadas?
João Trovão recostado no sofá, mais a dormir do que acordado, lá responde:
- Hã? ... O quê? ... Agora estava distraído ...
Depois de ver o seu marido, chegar-se para a frente, bocejar e esfregar os olhos, Maria reformula a pergunta:
- Não achas que as caminhadas são salutares?
- Noutro país talvez, em Portugal são um perigo!
Indignada com aquela resposta, Maria questiona:
- Então?
- Querida! Em primeiro lugar, em Portugal a rede viária não contempla a segurança dos peões ... os passeios ou são estreitos, ou são bastante escorregadios ou estão cheios de buracos, de carros, de caixas, caixinhas e caixotes, de postes de todos os tipos, géneros e feitios, de arvores, abrigos etc., etc. ... por outro lado, as passadeiras parecem ser colocadas nos sítios mais perigosos que se possa imaginar, como seja em locais com pouca visibilidade, em cima dos cruzamentos e das rotundas e/ou não são iluminadas ...
- Então e nas zonas rurais?
- Fora dos núcleos urbanos?... aí, os riscos de atropelamento são os mesmos, as bermas não existem e as que porventura existem estão por limpar ou recheadas com os mesmos elementos que existem nos passeios das cidades ou vilas, mais os rail’s ... e aí temos um terceiro ponto ... que são os cães à solta ... que mesmo estando no interior das propriedades, a todo o momento saltam para o exterior e atacam quem passa ...
- Falaste do primeiro ponto e do terceiro ... e o segundo?
- O segundo, são os assaltos que tanto ocorrem na cidade como no campo ... e que cada vez têm contornos de maior violência...
- Então concluis que...
- Concluo que os riscos que corro ao fazer caminhadas e os prejuízos que posso vir a ter, de dia ou de noite, são bem maiores que os benefícios que posso obter ...